segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

26- O BOI NA ARTE POPULAR BRASILEIRA - O boi de barro

Mestre Vitalino modelando um boizinho, FOTO de Pierre Verger.

O ceramista  re-inventa a arte do Criador que fez Adão a partir do barro. Cúmplice das formas telúricas, ele deixa que suas mãos “despertem” as formas vivas adormecidas no âmago da terra.
Assim, muitos boizinhos foram “despertados” do barro no período florescente da nossa arte popular por volta dos anos 40, quando o Brasil ainda era um país essencialmente agrícola.
Dentre muitas mãos criadoras anônimas destacaram-se as de Mestre Vitalino, que foi reconhecido por sua virtuose e liderança entre os ceramistas do Alto do Moura, Pernambuco.
Na arte popular, seus autores são gente do povo. São expressos os valores da cultura local assim como aspectos do inconsciente coletivo. A matéria prima usada na criação é o que se tem em torno. 
O uso do barro queimado, a cerâmica, como matéria prima está presente em toda parte do mundo. A peça mais antiga de que se tem notícia foi encontrada na Tchecoslováquia, datando de 24.500AC.
No Brasil, importantes peças de cerâmica de 8.000 anos atrás  foram encontradas na região da Floresta Amazônica. 

Referências bibliográficas: 
 - "O Mundo da Arte Popular Brasileira - Museu Casa do Pontal", Angela Mascelani, Ed.   MAUAD;
- "Sol da Terra, o uso do barro em psicoterapia", Álvaro Gouvêa, Summus Ed.


segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

25- O BOI E A ARTE - Picasso e o touro


Considerado por muitos como o maior artista do século XX, Pablo Picasso frequentemente usava o touro como tema de seus trabalhos.
Desde a infância desenhava a tourada. Sua primeira obra preservada, um óleo sobre madeira pintado aos oito anos, foi chamada O Toureiro. Picasso conservou este trabalho por toda sua vida, levando-o consigo sempre que mudava de casa.
Em 1945, iniciou uma série de onze litografias intitulada Touro (FOTO). Nesta seqüência de gravuras, todas extraídas de uma única pedra, Picasso disseca visualmente a figura de um touro buscando seu espírito através de uma forma essencial. É uma obra prima que desenvolve um trabalho artístico desde o estilo acadêmico até o abstrato. 
Picasso usou o touro como uma metáfora em várias obras. Dependendo do contexto, tem sido interpretado de diferentes formas: como uma representação do povo espanhol, como um comentário sobre o fascismo e a brutalidade, como um símbolo de virilidade ou como uma reflexão sobre sua própria imagem..
A série Touro é também uma alegoria do ciclo de vida e morte descrevendo estágios que vão ao apogeu da materialidade e daí ao extremo da sutileza do corpo do animal. Vemos o touro  ganhando volume e linhas de força que ressaltam o desenho de seus músculos até a terceira gravura. A partir da quarta gravura o artista vai tornando mais abstrata a estrutura simplificando sua anatomia, suavizando e reduzindo sua forma. O órgão reprodutor é ressaltado pelo tom mais escuro a partir da segunda até a penúltima gravura. Observe na foto acima.
A primeira gravura, como um esboço, insinua muitas possibilidades. Representaria a infância?
Na última gravura, Picasso retrata a essência, o espírito do animal. Representaria o estágio último da vida?

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

24- O BOI E A ARTE - Humberto Espíndola, o pintor dos bois


Humberto Espíndola é um nome destacado na história da cultura brasileira, sendo considerado um dos principais artistas plásticos da região centro-oeste. Num estado com mais de 30 milhões de cabeças de gado, ele é conhecido como o ‘pintor dos bois’. A cotação da sua ‘arroba’ é a mais cara do estado e comprador não falta. O segredo é que os bois de Humberto não morrem jamais. Tornam-se imortais depois de soltos entre os quatro cercados da tela. Em 1989 foi convidado de honra para expor seus bois na Fundição Progresso como parte do movimento ‘A Queda da Farra do Boi’, criado numa parceria entre a Dra Nise da Silveira e Perfeito Fortuna.

Humberto, o boi ainda representa hoje aquele símbolo que você elegeu na bovinocultura dos anos 60?
Ainda é um símbolo muito forte.
Naquela época eu via o boi como um símbolo regional, como alguma coisa que tinha embrutecido a nossa sociedade. Hoje, pelo contrário, vejo como enriqueceu a nossa sociedade.
Eu satirizava os que viviam das benesses do boi e não eram capazes de apreciar a beleza plástica deste animal. Foi pintando que pude estudar melhor a sua estética.
Dos anos 60 pra cá houve um aperfeiçoamento das raças. Chegamos a um nelore de milhões de reais que aparece na televisão cheio de luzes e cores. É um boi-show para o leilão-show.
Hoje uma pessoa que cria gado fala: ‘ai que vaca linda', 'que touro maravilhoso’. Antes ninguém achava bonito e nem queria saber de botar um boi na parede. Uma das minhas batalhas estéticas foi buscar devolver aqui o status de beleza desse animal que a história da pintura consagrou.
Se para outras civilizações do passado ele era símbolo de deuses é porque certamente o acharam bonito. Na  mitologia indiana a vaca é a mãe do universo. A Via Láctea é chamada assim porque foi o leite que espirrou da teta da vaca que pariu o universo.
Já no Brasil a vaca era só um animal rude dos campos.
Mas esses fazendeiros de ontem são hoje os avós de uma sociedade mais requintada. É um pessoal que juntou dinheiro, consolidou o homem na terra e fortaleceu politicamente este Estado.
Tudo veio do boi.

Notas:
1) Sobre Dra Nise x A Farra do Boi, ler postagens anteriores deste Blog.

2) Sobre a obra de Humbertho Espíndola  recomendo no Youtube MATULA TV-Humberto Espindola-ZenBoi. Belíssimo! Endereço: 

 http://www.youtube.com/watch?v=u3LCRXEpEAA 



terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

23- Reflexões Rupestres


Dra Nise dizia que vivemos ao mesmo tempo entre pessoas
do período paleolítico e da Idade Média,
com gente de cinco mil anos atrás
e com gente de séculos adiante de nós.
O que você acha disso?
E dentro de você, 
já se sentiu alguma vez como um(a) homem(mulher) das cavernas?

Franklin Cascaes, folclorista de prestígio 
e especialista na cultura catarinense,
 classifica a Farra do Boi como “vampirismo medieval”.
Você concorda com essa opinião?

Nota:
Na foto, Dra Nise da Silveira na oficina contra a Farra do Boi, no pátio externo do MAM, em 89.
Sobre o tema, ler postagens anteriores desse blog.

22- O BOI E A ARTE - Na arte rupestre ( parte 2 de 2 )


Talvez por ter sido a caça mais cobiçada, a representação do bisão seja também a mais comum na arte rupestre. Na caverna de Lascaux (foto), na França, existe uma câmara chamada Salão dos Touros. Suas paredes são inteiramente cobertas de pinturas que narram a caçada a esse animal.
Segundo Aniela Jaffé  o bisão coberto de flechas da pintura  não teria apenas uma intenção decorativa. Os moradores das cavernas acreditavam que matando ritualmente a imagem garantiam matarem o próprio animal.
Quanto mais primitivo é o homem mais literais são seu pensamento e sua expressão. Assim o ser vivo é fortemente identificado com sua imagem, que é considerada sua alma. Até hoje em dia encontramos pessoas que evitam ser fotografadas por essa razão.
O sentido do sagrado na arte rupestre é reforçado pelos locais, por assim dizer secretos, de difícil  acesso em que se encontram, protegidos dos olhares comuns. 
Na Europa, no século XV, o Papa Calisto II proibiu as cerimônias religiosas que eram realizadas numa caverna da Idade Glacial, com animais pintados. 
E ainda nos tempos atuais viajantes nômades depositam oferendas votivas diante das antigas pinturas no Norte da África. O numen(1) do lugar resiste a milênios!

Notas:
1- Numen é um termo do latim que significa  o poder ativo do divino. 
Numinoso é um conceito de Rudolf Otto que designa o inexprimível, misterioso, tremendo, o "totalmente outro", propriedades que possibilitam a experiência imediata do divino.

2- Referência bibliográfica: "O Homem e seus símbolos", concepção e organização C.G. Jung, Ed Nova Fronteira - Cap. 4: "O simbolismo nas Artes Plásticas", por Aniela Jaffé.


3- Sobre a Dra Nise da Silveira e A Farra do Boi ver postagens anteriores deste blog.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

21- O BOI E A ARTE - Na arte rupestre (parte 1 de 2)


Antes mesmo de conhecer a escrita o homem do período paleolítico foi capaz de produzir obras de arte que se tornaram verdadeiros testemunhos da vida de culturas primitivas extintas. A arte rupestre foi gravada em  cavernas em suas paredes e tetos rochosos cerca de 20.000 anos atrás.
Prospecções arqueológicas realizadas em cavernas na Europa, Ásia, África e outras revelam o surgimento entre os primitivos homens caçadores, dos primeiros artistas. São pinturas e gravações que demonstram como o desejo de expressão através das artes e a capacidade de simbolizar são inerentes ao ser humano.
Além de imitar a natureza com o máximo de realismo, a arte do homem das cavernas sugere  um caráter mágico de propiciar  fertilidade e conservação daquilo de que necessitava.
Conhecida como a Capela Sistina da pré-história tamanha a quantidade e qualidade das suas pinturas, a caverna de Altamira na Espanha exibe a representação do bisão (foto), o ancestral bovino. Realizada com vibrante policromia é considerada a mais famosa e admirada pintura rupestre.


Notas:
1- Referências "O Homem e seus símbolos", concepção e organização C.G. Jung, Ed Nova Fonteira. Capítulo 4: O simbolismo nas Artes Plásticas, por Aniela Jaffé.;
2- Sobre experiência simbólica ver postagens 16 e 17 de janeiro de 2011 deste blog.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

20- A fome transforma os alimentos em deuses



"A fome transforma os alimentos em deuses...
Osíris era o trigo, o filho da terra, e por isso as hóstias até o presente são feitas de farinha de trigo e representam um deus que será comido...
O touro de Mitra representa a fertilidade alimentar da terra.(2)
As condições psicológicas do meio ambiente naturalmente deixam traços míticos semelhantes atrás de si.
Situações perigosas, sejam elas perigos para o corpo ou ameaças para alma, provocam fantasias carregadas de afeto, e na medida em que tais situações se repetem de forma típica, dão origem a arquétipos, nome que dei aos temas míticos similares em geral."(3)

Notas:
1) Na foto C. G. Jung.
2) Sobre o touro de Mitra  ver neste blog postagens 11 e 12, de dezembro de 2010.
3) C. G. Jung, CW parags. 332/333.