terça-feira, 21 de outubro de 2014

120- O Fetichismo (1) da Carne do Boi na Ação Urbana de Ronald Duarte (Matadouro - Boi - 2/3)

No Arpoador
Ronald Duarte (2) nasceu em Barra Mansa, 1962.  Mestre em Linguagens Visuais vem nos últimos anos realizando Ações Visuais Urbanas usando a linguagem da Arte Contemporânea.
Trabalha especificamente com a urgência urbana, isto é,  com aquilo que precisa ser feito, dito, exposto, visualizado no aqui-agora. Este ano, Ronald Duarte trouxe às ruas cariocas Matadouro Boiada de Ouro, apresentada anteriormente em Berlim.  



Na Cinelandia


Esta Ação acontece com dezenas de pessoas vestidas com cabeças de boi douradas e andando como se estivessem indo para o abate. A proposta critica a fetichização (2) da carne, que hoje tem até grief como, por exemplo, o Friboi. A utilidade da mercadoria carne do boi deu lugar a um valor simbólico. Não é  comprada pelo seu valor real, mas sim por um valor transcendente que é atribuído a ela.


“O boi é manso, subserviente, mas sua carne é esquartejada e vendida como artigo de luxo. O mesmo acontece com o artista e seu trabalho”, diz Ronald.

Veja aqui neste blog, outros artistas que também se inspiraram no tema Matadouro - Boi:  Cora Coralina, na postagem 119, em "O Erotismo na Obra de Cora Coralina" e Arnaldo Antunes, na postagem 122, em "Boi Arnaldo Antunes", de 2014.

E sobre a relação Fetichismo - Boi, veja mais nas postagens 85 "O Bezerro de Ouro Contemporaneo" e 86 "O Bezerro de Ouro Bíblico", de 2012.

NOTAS:
1) O fetiche (do francês fétiche, que por sua vez é um empréstimo do português feitiço  cuja origem é o latim   facticius "artificial, fictício") é um objeto material ao qual se atribuem poderes mágicos ou sobrenaturais, positivos ou negativos. Também foi usado por Freud no campo da psicopatologia. Mas no caso da Ação Urbana de Ronald Duarte, o fetichismo da carne do boi relaciona-se ao significado conferido ao fenômeno por Karl Marx (1818 – 1883) em seus estudos sobre o mundo do trabalho na modernidade, quando observou a atribuição de valor simbólico dada aos produtos (manufaturas). Em sua obra máxima O Capital, relata que a mercadoria quando finalizada, não mantinha o seu valor real de venda, determinado pela quantidade de trabalho materializado no artigo.  Mostrou haver uma valoração de venda irreal e infundada, como se não fosse fruto do trabalho humano e nem pudesse ser mensurado. Quis denunciar com isto é que a mercadoria parecia perder sua relação com o trabalho e ganhava vida própria. Denomina este fenômeno como sendo um "fetiche da mercadoria" baseado na história do personagem bíblico Moisés, que após vagar quarenta anos com o povo escolhido por Deus (Judeus) atrás da terra prometida se depara com a crescente descrença dos seus seguidores, que já estavam cansados de se deslocar por vários lugares. Moisés, deixa o seu povo em uma terra fértil e se retira temporariamente para meditar e procurar algum sinal que indique a localização da terra prometida. Sobe ao monte Sinai e fica por muito tempo meditando até que os céus se abrem e deles surgem o sinal tão esperado pelo povo Judeu, as tabuas da salvação, onde estavam contidos os Dez Mandamentos. Moises desce o monte Sinai e vai de encontro ao seu povo para lhes contar e mostrar a boa nova. Ao chegar se depara com novas lideranças que haviam juntado todo o ouro e jóias que carregavam consigo e que fundiram  para fazer uma imagem de um novo Deus, que segundo a Bíblia seria a imagem de um bezerro, objeto de adoração e glorificação pelo povo. O nome atribuído a esta imagem era "Fetiche".
Marx se utilizou desta parábola bíblica e principalmente do nome atribuído à imagem citada para exemplificar na modernidade como o homem estava tratando as mercadorias de consumo, que com o tempo deixaram de ser um produto estritamente humano para tornarem-se objeto de adoração. 

2) Algumas outras  Ações de Ronald Duarte:

Em 2001, num dialogo com a violência urbana, lava  ruas de Santa Teresa com Água Vermelha ,  cor de Sangue. Em 2002, Fogo Cruzado, continuando com esse diálogo, ateia fogo em 1.500 metros de trilho do  Bonde de Santa Teresa; em 2003, fazendo parte ainda dessa série, realiza  A Sangue Frio, onde espalha pela cidade pedras de gelo com corante vermelho embaladas em cobertores como aqueles usados ​​por meninos de rua. As pedras de gelo com corante simulavam uma criança ferida e deitada nas calçadas do Centro do Rio de Janeiro; em 2004 Realiza: Nimbo/ Oxalá: com 20 extintores de incêndio e vinte artistas, todos de branco, acionando extintores formando uma gigantesca nuvem, próximo de um cogumelo atômico, envolvendo o os artistas e  que desaparece, se misturando ao céu; em 2005, em Paris produziu Fumacê do Descarrego uma chaminé de cata-ventos de fumigação com alecrim, benjoim e lavanda. Naquele mesmo ano, cria Caminhar sobre ovos, um rito gigantesco com 3.200 ovos; 28 atores locais andando sobre ovos na Esplanada dos Ministérios, em Brasília; em 2006, nas ruas de Santa Teresa criou Treme Terra, com Aderbal de Ashogum, construindo esculturas sonoras com 50 atabaques; em 2007, fez uma interferência dentro do Palácio Imperial de Petrópolis, especificamente na sala de música da princesa Isabel, com o Funk da Coroa, onde usou cartazes gigantes nas portas da sala para transformar a paisagem do lado de fora no Morro da Coroa (favela do Rio), ao mesmo tempo, usando música de fundo  o Funk Proibidão.