segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

110- Déjà vu


No Dicionário do Aurélio, há três definições para o termo déjà vu, "já visto" em francês:
 1. Aquilo que dá a impressão de já ter sido visto ou presenciado; 
 2.  A sensação de já haver estado em determinado lugar ou em certa situação quando isso, na realidade, não aconteceu; 
 3.  E, segundo a neuro psiquiatria, se relaciona à um tipo de ilusão epiléptica durante a qual o indivíduo interpreta mal objetos que, entretanto, vê bem e que passam a ter, para ele, características anormalmente familiares. 
O déjà vu, na maioria das vezes,  ocorre sem qualquer conotação patológica e são muitas as teorias que se tem a respeito de como e por que esse fenômeno acontece.
Quando algo sabidamente se repete na vida de alguém, é justo chamá-lo de déjà vu.  
Mas o termo déjà vu, conforme foi cunhado por Emile Boirac (1851/1917), define a misteriosa sensação de estar diante de uma situação nova, como se esta já houvesse sido vivenciada antes, sem que haja uma comprovação ou  lembrança consciente para servir de referência. 
Para os espiritualistas o déjà vu é uma "lembrança" de vidas passadas.
Freud relacionou-o ao estranhamente familiar. Dizia que o déjà vu resultava de lembranças de desejos inconscientes ou fantasias do passado que eram ativadas pela situação presente.
Jung (1) experimentou um déjà vu quando foi à África pela primeira vez. Disse que sentiu como se estivesse retornando à terra onde vivera há muitos anos. Este fato foi intitulado como "reconhecimento do imemorialmente conhecido".
Enquanto Freud referiu-se ao tempo linear, atribuindo a origem do déjà vu ao inconsciente pessoal, o que é descrito por Jung refere-se a um passado ancestral arquetípico, pertencente ao inconsciente coletivo onde o tempo é de outra ordem.
A sensação de déjà vu é descrita com freqüência em situações cotidianas e na literatura clínica. No final do século XIX a opinião médica concordava que o déjà vu fosse um distúrbio de memória, uma paramnésia.
Segundo observaram alguns neurologistas este fenômeno pode ser provocado por pequenas tempestades elétricas no lobo temporal direito (micro-epilepsia), bastante freqüentes nos momentos que antecedem as crises epiléticas em portadores desse sintoma.
Nesse caso, a neuropsiquiatria usa o termo ilusão epiléptica quando o indivíduo interpreta mal os objetos que, embora veja bem, passam a ter para ele características anormalmente familiares. Este fato era muitas vezes interpretado pelos antigos como um dom divino, tendo por essa razão denominado a epilepsia como a  "doença dos deuses".
Nos anos 50 o neurocirurgião canadense W. Penfield ao estimular eletricamente lóbulos temporais relatou fenômenos de déjà vu.
Outro processo que pode estar atrelado à produção do déjà vu é o da ação neuroquímica do cérebro. Ivan Izquierdo (1970) e colaboradores descobriram que a memória é modulada por diversos mecanismos mediados por neurotransmissores como a serotonina, a dopamina e a noradrenalina e também por hormônios como a adrenalina, a beta-endorfina, a vasopressina e os corticoides, e mais recentemente o ácido glutâmico (mecanismo excitatório) e o aminoácido gama-amino-butírico (um inibidor). A modulação da memória por todas essas substâncias torna-a sensível às emoções e ao estado de ânimo, desde os processos inerentes a sua formação até a evocação de lembranças.
O modelo de memória anterior inspirado na associação de idéias talvez não tenha sido o mais apropriado para descrever adequadamente a complexidade desse fenômeno. De acordo com a visão atual da neurociência o déjà vu pode ser provocado de forma independente, sem haver uma memória real (pessoal) para acioná-lo.
Pesquisas mais recentes apontam para o fato que reconhecer um objeto ou situação familiar engatilhe dois processos no cérebro. Primeiro, a mente faz uma busca em seu arquivo para descobrir se os conteúdos daquela cena já foram vistos antes. Depois, em caso afirmativo, uma outra parte do cérebro identifica a cena ou o objeto como familiares. 
Explorando esta teoria de dois passos, uma equipe de cientistas da Universidade de Leeds, no norte da Inglaterra, mostraram a dezoito voluntários vinte e quatro palavras comuns e em seguida os colocaram em estado alterado de consciência, num processo semelhante à hipnose.
Os voluntários foram então induzidos para que quando estivessem diante de qualquer palavra em uma moldura vermelha sentissem a palavra como sendo familiar. Tirados do estado de hipnose e expostos a uma série de palavras em molduras de cores variadas, dez voluntários disseram ter experimentado uma estranha sensação quando viram palavras, mesmo quando novas emolduradas em vermelho. Outros cinco disseram que esta sensação definitivamente se parecia com um déjà vu.
No dia-a-dia, o déjà vu pode ser induzido por pequenos detalhes comuns como estímulos visuais, sonoros, olfativos ou táteis. A natureza da percepção sensorial pode justificar o fenômeno como um processo ligado a uma ligeira falta de sincronização entre os diversos caminhos que o estímulo percorre nas áreas cerebrais envolvidas nos processos de memorização e familiarização. Os estímulos ao percorrerem duas vias distintas ao mesmo tempo podem em uma delas sofrer um ligeiro retardo e a via da familiarização ser estimulada antes da memorização e produzir o fenômeno de déjà vuMas porque acontece ou não o ligeiro retardo na via de memorização em relação a da familiarização, a ciência (ainda) não é capaz de explicar.

"Complexo, instigante, este tema. Vemos a interpretação de Jung de déjà vu se antecipando à visão atual da neurociência",  comentou a psicoterapeuta junguiana Marilene Séllos.  

Para mais informações sobre a perspectiva junguiana, leia nesse blog a postagem 109 -  "Déjà vu e Sincronicidade".

Um comentário:

  1. .Marilene Séllos, via email:
    "Sempre aprendendo com seu blog. Complexo, instigante,este tema. Vemos a interpretação de Jung de déjà vu, se antecipando à visão atual da neurociência."

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