terça-feira, 24 de janeiro de 2012

66- Ave Eva e o Boi de Matutu


Dessa vez foi em Matutu, um vale encantado no meio das montanhas do sul de Minas Gerais, que encontrei mais uma representação artística do boi. Seu autor é Cândido de Alencar Machado, um artista plástico sui-generis que trocou a cidade grande pelo ritmo e luzes da natureza.
Vive em sua fazenda-pousada, onde a alimentação é vegetariana e muito saborosa.
Cândido é uma figura carismática de prosa fácil, generoso em compartilhar suas muitas histórias. Quando recluso no seu atelier faz brotar sua arte, mergulhando no quase silêncio que só é interrompido pelo canto dos pássaros e pelo mugido do gado.
Recria com muita propriedade obras em mosaicos que, como na antiguidade romana, reproduzem cenas da iconografia cristã só que inspiradas pela atmosfera de Matutu, usando sua flora, fauna e rostos locais.
A mandala da foto exibe um quadrado central com a imagem de Jesus menino no seio da Virgem Maria, a nova Eva (1), ocupando o eixo da árvore do fruto proibido do paraíso.
A mandala, palavra que significa círculo em sânscrito, quando é composta simboliza uma busca de ordem cósmica. Segundo C. G. Jung, é uma imagem do self, da totalidade da psique.
Como nas mandalas budistas, o centro da mandala de Cândido é ocupado por uma fonte de poder divino: o coração de Jesus menino. As imagens periféricas seriam manifestações ou aspectos de impulsos e de valores contidos na figura central.
Ainda no eixo, enroscada no tronco, está a serpente que faz lembrar a serpente do bastão de Asclépio,  o deus grego da Medicina e da cura. A serpente oferece a  maçã, o fruto proibido, a chave que abre a porta de saída do paraíso e marca também a entrada no estágio da consciência das polaridades: bem-mal, vida-morte, claro-escuro, alegria-dor...
De cada lado, ornados por muitos pássaros brancos, numa representação da divisão da totalidade na polaridade masculino-feminino, estão Adão e Eva,
Formando uma cruz arredondada, o quadrado é circundado nas quatro direções pelas imagens do boi, do leão, da águia e do anjo, associadas na visão do profeta Ezequiel aos quatro evangelistas.
São Lucas (2), o evangelista que mais insiste no aspecto sacerdotal de Jesus Cristo, é representado pelo boi. Na antiguidade, o sacerdote tratava dos assuntos religiosos e tinha o poder de oferecer vítimas às divindades. Simbolicamente, o próprio sacerdócio pode ser considerado como um auto-sacrifício.
 O boi é escolhido como representação do sacrificado por ter ocupado predominantemente este papel nas religiões antigas.

NOTAS:
1) Sobre esse tema visite:  http://youtu.be/-Mz47NIFQ_E
2) A opinião mais aceita é de que antes de abraçar o cristianismo, São Lucas teria nascido pagão, na Grécia e de que teria falecido de morte natural aos 84 anos. Como enfrentou muitos perigos por sua fé, é considerado por muitos como mártir.

2 comentários:

  1. Que beleza de trabalho. E que descrição bonita feita por você. O autor da mandala-cruz também é cantor, tem dois álbuns gravados de músicas que deixam nossas almas mais perto da beleza do sagrado.

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  2. Obrigada RaiCFerraz pelo seu feedback. O Cândido é mesmo um artista completo. Foi bom vc lembrar.Valeu!
    Julia Andrade

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