domingo, 16 de outubro de 2011

56- O Conto Chinês

“Era uma vez na China, um mestre e um discípulo que andavam por uma estrada. O caminho era inóspito, agressivo. O ambiente não era favorável à vida. Avistaram, ao longe, uma casinha de aspecto miserável e para lá se dirigiram.
Foram abrigados pelo dono da casa e sua numerosa família que com eles compartilharam sua escassa comida e seu espaço para dormir. A alimentação provinha de uma única fonte: uma única vaca da qual tiravam leite e seus subprodutos.
Mestre e discípulo ficaram ali mais alguns dias e depois partiram.
Algumas horas depois da partida, o mestre disse ao discípulo:
- Volte lá, às escondidas, e jogue a vaca no penhasco.
Incrédulo, o discípulo argumentou:
- Mestre, o único bem dessa numerosa família é a vaca! O senhor me pede para jogá-la no penhasco?
- Sim - disse o mestre. Jogue a vaca no penhasco.
Mesmo sentindo uma enorme culpa o discípulo obedece ao mestre.
Anos depois mestre e discípulo voltam aquele mesmo lugar. Sem nada dizer ao mestre, o discípulo decide pedir perdão àquela gente por ter jogado a vaca do penhasco. Assim, sai à procura da pobre casinha, mas só o que vê é uma construção ampla e confortável. As pessoas alegres e bem vestidas, num ambiente onde o progresso era evidente. Pergunta a um deles:
- Há uns anos atrás aqui havia uma pequena e pobre casinha. Saberia me dizer para onde foram aquelas pessoas?
- Somos nós. Moramos aqui desde sempre - respondeu o homem.
- Mas, o que aconteceu? - disse, olhando o progresso a sua volta.
- Bem - disse o homem. Aconteceu numa noite um terrível acidente em que nossa vaca, nossa única vaca, caiu do penhasco e ficamos sem nossa fonte de sustento. Não tivemos alternativa, a não ser buscar outros recursos. Descobrimos, então, nossas próprias capacidades.”

O mestre é aquele que vê além das aparências, diferentemente do discípulo que só é capaz de enxergar o que está diretamente a sua frente. O mestre viu que a ausência da vaca, um aparente infortúnio para aquelas pessoas, consistia na sua verdadeira fortuna.
A vaca representa o recurso externo fácil e imediato no qual aquela família se apoiava e projetava seus recursos internos, que ficavam assim desconhecidos, na sombra (1).
Enquanto a vaca estava lá viviam o dia-a-dia, sobrevivendo sem pensar no amanhã, como animais, só experienciando os instintos da fome e sexual. A partir da falta da provedora, novos recursos internos se manifestaram instintivamente através da criatividade, do movimento e da reflexão.
Mas claro que essa estória é um “faz de contas”. Um verdadeiro mestre jamais mandaria matar a vaquinha!

2 comentários:

  1. Marilene Séllos:
    "Olá, Júlia!Me ponho a pensar que a falta,
    nos impulsiona na busca por recursos internos, até então desconhecidos.Abraço grande."

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  2. Andrea Ortiz postou no FB:
    "Este conto me propiciou sair da zona de conforto. Valeu !"

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